Então, hoje é dia 30 de março de 2006 e eu estou escrevendo de Leysin-VD, Suiça …. tem muito tempo desde que completei este percurso pela África, mas as memórias estão ainda vivas na minha cabeça.

Esta viagem foi a realização de um sonho de muitos anos, e sem dúvida uma das melhores épocas da minha vida. Eu vim para Leysin pela primeira vez para aprender francês, isso foi em 1989/90, já com a ideia de pedalar pela África. No inverno de 1998/99 eu voltei a trabalhar aqui pensando em começar a viagem logo após a temporada, mas foi uma temporada dura, muito dificil por conta do clima e muita neve nas pistas de ski. Então resolvi subir para Londres em abril e continuar trabalhando. Assim que cheguei, encontrei trabalho para pedalar um “rickshaw” – aquelas bicicletas tipo indiana que carregam passageiro – isso era completamente novo pra mim e também na cidade naquela temporada.

Em agosto eu senti que era hora de partir. Eu procurei por passagens aéreas em promoção para o Cairo, Egito ou Cidade do Cabo na África do Sul, pois imaginava pedalar cruzando o continente. Com as férias de verão no início eu não encontrei bilhete nenhum e sendo assim eu resolvi começar pedalando mesmo, de Londres até Nice, percorrendo 1800km em 18 dias. Visitei Mont St°Michel e outras belezas do percurso, até a cidade que para mim é uma referência, pois comecei lá minha primeira pedalada em 1991. Nice!! Sul da França.

Só de pisar no continente, de estar na África, já despertava um sentimento especial. Eu cheguei no aeroporto de Durban, muito tarde da noite e logo arrumei quem me ajudasse a encontrar um lugar pra dormir, que foi na sala de orações do próprio aeroporto. Na manhã seguinte sai pedalando até o centro da cidade e nova surpresa: Tive um carro de polícia me acompanhando até a cidade. Cheguei, encontrei um albergue pra ficar e capotei na cama, exausto. As pessoas estavam curiosas sobre minha viagem e também diziam que não era possível ir muito longe pedalando. Levou cinco dias pra eu reiniciar o pedal, seguindo para sudoeste em direção a Cidade do Cabo, visitei o Cabo Agulhas – o ponto extremo sul do continente – cheguei na Cidade do Cabo e subi, norte pra Namíbia, passei o rio Orange e cruzei o deserto, sem duvida um dos pontos altos da viagem. Dai, atravessei o Caprivi, entrei no Zimbabue, passei por Moçambique cruzando o estreito de Tete e então, o Malawi, subindo o lago até chegar na Tanzânia.

Nessa hora eu posso dizer que estava completamente satisfeito, pedalando todo esse tempo e cobrindo mais de 8000km sem nem uma dor de cabeça, malária, diarréia, nada nada. Ah!! Sim, claro, quebrei o aro traseiro no Caprivi, dia que tinha que pedalar 200km pois fui informado pelo exército que leões circulam naquela área a partir do fim de tarde. Dei de cara com um elefante cruzando o Parque Nacional de Victoria Falls no Zimbabue e ainda tive que me livrar de um “habitante local” que insistiu em “fazer uma massagem” nas minhas pernas fortes e cançadas!!? Sem dúvida, o animal mais perigoso que podemos encontrar no mundo, ainda é o homem.

Em Arusha, Tanzânia eu visitei o monumento que representa a metade do caminho – 9000km – na travessia “Cape to Cairo”. Dei uma parada no pedal para aproveitar um grupo e visitar o Serengueti e Nogorongoro. Fantástico, com certeza eu passei meses maravilhosos e tive tudo que poderia ter de uma viagem de bicicleta pela África. A partir daí eu só pensava em pedalar em segurança até Nairobi e eu consegui. Quando olhei para o aeroporto internacional de Nairobi, no Quênia eu estava em lágrimas, emocionado, como estou agora, concluindo 9300km pedalando com saúde e segurança pela África.

Thank’s God for all!!